A "metáfora verdadeira", na acepção de Bachelard,é verdadeira duas vezes:" verdadeira na sua experiencia e verdadeira no seu élan onírico". E refere como exemplo a "vinha alquímica", que tanto pode ser uma experiencia do reino vegetal, palpável, como um sonho de transformação do vegetal no mineral ; da vinha poderá assim fazer-se a uva, ou um rubi, um moscatel ou um crisópraso, como se vê na obra de Huysmans.
Há uma transitividade própria da experiencia do real e do sonho.E o que é o vinho, neste caso?Diz Bachelard: "o vinho é um corpo vivo onde se equilibram os espíritos mais diversos (eu gostaria de acrescentar complementares) os espíritos voadores (eu diria voláteis) e os espíritos ponderados (eu diria fixos, como dizem os alquimistas, ou amadurecidos ), conjunção de um céu e de um terreiro (entenda-se um céu e uma terra, como no dizer chinês)...o vinho segue, amadurecendo, o ciclo das estações e assim encontra a arte mais admirável:a arte de envelhecer". Bachelard dixit, interpretando os textos dos poetas e prosadores literários mais próximos do imaginário alquímico, que hoje em dia nem aos cientistas será estranho, como o foi no tempo em que Bachelard escreveu.As anotações dos parênteses são de minha autoria, não o comprometem.
Paul Celan escreveu: "Tudo é menos do
que é,
tudo é mais."
O sonho alquímico ajuda a que se veja mais.
Mas nem toda a vinha oferece um vinho de amor, como no Cântico dos Cânticos.Os vinhateiros do mesmo Paul Celan escavam mais fundo o vinho-sumo da morte:
"Vinhateiros escavamo relógio das horas sombrias
cada vez mais fundo,
tu lês,
o Invisível
desafia
o vento,
tu lês,
os Abertos trazem
a pedra atrás do olho,
ela te reconhecerá,
no dia do Sabbath. "
(in A Cerca do Tempo)
Aqui vemos, emanando de uma mesma cultura ancestral, como o símbolo se inverte , numa tremenda dinâmica de sofrimento e regressão.
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