Tuesday, November 05, 2013

Pintar o Sete
 Este seria o livro a ler, de Mestre Lima de Freitas sobre Almada Negreiros, poeta, pintor, dramaturgo, fundador com Fernando Pessoa e outros do Futurismo em Portugal.
Um 7 que no seu caso, de grande conhecedor, teria muito a ver com o quadrado mágico da Melancolia de Duerer, em que o n.34 é obtido em todas as somas que se façam dos números inscritos no seu interior.
O 34 remete para um 7, na sua soma, se a desejarmos simbólica e relacionada com o Axioma de Maria Profetiza, que Jung estudou nas suas obras  relativas à alquimia e seus símbolos: " do Um nasce o dois, do dois nasce o três e do três nasce de novo o Um como quarto.
Este quarto elemento é o 4 da Totalidade, que o Um inicial em si continha.
Do mesmo modo, por analogia (simbólica) o 7 que resulta da soma do 3 e do 4 é figuração da Totalidade: três princípios e quatro elementos formam a estrutura base do que será o caminho da Obra oculta.
Nas civilizações antigas, como a Assíria, a Egípcia, a Maia, este número tem implicações que o ligam à simbólica e ao imaginário celestial: os 7 planetas que os sábios astrónomos podiam contemplar nos céus escuros, por exemplo. E os deuses que eles representavam.
Na tradição judeo-cristã, descobrimos logo no Génesis o 7 como número da perfeição, pois foi no sétimo dia que o Criador repousou, consagrando esse dia como dia de uma totalidade que podia ser admirada e venerada em especial.
Passo adiante o conhecimento geral dos 7 dias da semana, e a totalidade do que são as energias, os ramos das árvores de iniciação, as virtudes e categorias morais, etc.
Tudo se encontra num bom Dicionário dos Símbolos, como o das edições Robert Laffont, de que em geral me sirvo.
Na tradição grega o 7 está relacionado com o deus Apolo: as suas festas eram celebradas no sétimo dia do mês. E recordemos as sete cordas da lira, as sete portas de Tebas, etc.
 Mas também na China, as festas populares tinham lugar a um sétimo dia: com os sete emblemas de Buda.
Na peregrinação a Meca, são sete as voltas a dar.

Esta presença do sete, tão generalizada, tem certamente a ver com a contemplação dos céus e os seus indecifráveis mistérios.
Como se nesse número se concentrasse a totalidade do espaço e do tempo (simbólico, religioso).
Sobre a magia da matemática não tenho competência para me pronunciar e não o farei, lembrando contudo que os antigos sacerdotes eram matemáticos, além de astrónomos, e já na nossa era igualmente alquimistas, como Zosimo de Alexandria (séc.III) e Maria Profetiza.
Diz-se que Hipócrates terá feito a seguinte afirmação:
"o número sete, pelas suas virtudes ocultas, sustenta no ser todas as coisas; dispensa a vida e o movimento, influenciando mesmo os seres celestiais".
A carga dinâmica deste número pode ser assustadora, como no Apocalipse de João: recordo apenas as sete cabeças, as 7 pragas, mas podemos ler no texto a sucessão de referências.
Para quem se interesse pelo budismo, encontramos no Livro Tibetano dos Mortos uma "intensificação" das energias do 7:
sete vezes sete = 49.
Este é o número do Bardo, o estado intermédio em que se penetra depois da morte, até renascer de novo ou entrar na redenção final. O 49 divide-se em 7 períodos transitórios, de sete dias cada, enquanto são feitas as rezas junto ao corpo do morto.
A simbólica do número permite ainda que se jogue com outros modelos: 70, 700, 7000,e por aí adiante.Mas só um especialista na Gematria nos poderia ajudar!
D.Francisco Manuel de Melo, no seu Tratado da Ciencia Cabala, expurgou a Gematria, proibida pela Inquisição. Contudo não deixa de ser muito interessante, para um estudioso dos mistérios, esta obra do século XVII.
Por mim gosto da meditação no Axioma de Maria: do Um ao Todo, um imenso caminho a percorrer...






Monday, September 30, 2013

Richard Zimler

Recebi hoje pelo correio um pequeno livro que me interessou logo pelo título.
De Richard Zimler, LOVE'S VOICE, 72 Kabbalistic haiku, de 2010 e julgo que sem tradução portuguesa, por enquanto.
No título, a junção da Kabbalah, da tradição judaica e mística medieval com os Haiku, da tradição japonesa igualmente antiga e marcando um imaginário literário e místico não menos importante, despertou-me a curiosidade: Zimler revelava-se já, sem que eu tivesse lido ainda o livro, um autor culto, um estudioso, como se vem a descobrir no prefácio que escreve, das religiões comparadas.
Cita duas fontes que são fundadoras para qualquer estudioso:
Gershom Scholem, Major Trends in Jewish Mysticism, e Mircea Eliade cujos vastos estudos na área da História das Religiões, Lendas, Mitos e Símbolos não podem ser ignorados.
Zimler, nascido em Nova-Yorque no seio de uma família judaica, ao radicar-se em Portugal dedicou-se ao estudo, que transformou em ficção regular, da nossa ancestralidade judaica, origens e destinos. O ÚLTIMO KABALISTA DE LISBOA foi o romance que o tornou conhecido, entre nós e no mundo.
Estes 72 exercícios de meditação subtil sobre a essência do amor e da vida, que encontrou talvez na leitura do ZOHAR, o livro do Esplendôr, ou quem sabe na mais prática e não menos subtil visão do TAOÍSMO original, são de leitura agradável e descomplicada na aparência, encerrando quem sabe a chave da sua escolha de Portugal para viver...Aqui pode ser um tranquilo anónimo, e ainda que saboreando o seu sucesso de escritor, viver no coração de um silêncio que aprendeu a amar:
Your soul will begin
to sense its depth when you stop
running from silence.

A tua alma começará
a sentir a sua profundidade
quando parares de fugir ao silêncio.

Assim começa o livro.
E assim acaba:

You will never solve
ev'ry mystery - God is
not a whodunit!

Nunca poderás resolver
todo e qualquer mistério -
Deus não é um qualquer! 

Há pelo meio secretos acenos:
 Dreaming of Moses
parting the Sea, I awake
in the Promised Land.

Sonhando com Moisés
dividindo o Mar, despertei
na Terra Prometida.

Ou por exemplo outro caso, de "diálogo" com a Bíblia, e a moral do Génesis:
Eve separated
from God but woke to her self:
Paradise exchanged

Eva separou-se de Deus
mas despertou para si mesma:
Troca de Paraíso.

Não vou retirar aos leitores o prazer de folhear, ler ou reler  e descobrir as afinidades que possam ter com esta forma de pensar o pensamento. Eu encontrei muitas, comigo mesma, outrora e agora.
Por isso deixo aqui uma discreta homenagem. É um livro de conversa, não é um livro de conversão...e assim podemos voar um pouco com um Anjo de Rilke, apenas no seu pressentimento, pois vê-lo seria morrer de tanta e forte presença, podemos assistir à fusão deslumbrada do ouro de um alquimista, sonhar à beira de um rio de margens infinitas, ou como Jacob na sua escada descobrir no último degrau que é ele mesmo, o Homem, o oculto rosto de Deus. 

Wednesday, February 06, 2013

Mitos:Nacionais, Universais...


Mitos Nacionais/Universais /Mitos ou lendas populares


O que é um mito: uma narrativa fundadora, de dimensão simbólica, nacional ou universal.

Mitos nacionais (portugueses) :
Dom Sebastião e os mitos do Encoberto; Dona Inês de Castro,os mitos de amor eterno de Dom Pedro e Dona Inês;as Cartas da Portuguesa, outro mito do amor eterno, de autoria francesa, mas atribuídas a uma monja portuguesa do século XVIII ; ainda fazendo parte deste corpus literário e mítico a história de base celta, de que Richard Wagner fez uma obra-prima, de Tristão e Isolda;
em torno destas figuras históricas se desenvolveu uma teia de construções literárias, pictóricas, dramatúrgicas, em Portugal e na Europa.

Relação do mito do Encoberto com Dom Sebastião.
A doutrina do Sebastianismo como doutrina messiânica nacional e nacionalista: ex. Padre António Vieira e Fernando Pessoa.

Mitos universais do Ocidente: Fausto (entre outros, como o de Orfeu, o de Prometeu, o do Andrógino, bebidos na tradição popular, no caso de Fausto, na literatura grega clássica, nos outros casos; ou mitos mais recentes como o de D.João, o”Burlador de Sevilha” ou o de Carmen, como mulher fatal, na opera de Bizet).

Ver o mito de Fausto no Renascimento, no Século das Luzes ( Goethe,séc.XVIII), no Romantismo (Berlioz) e na Modernidade (Pessoa e Valéry ).
O Fausto mudo de Murnau, a ópera de Gounod, a performance dos Fura dels Baus inspirada em Berlioz – tudo interpretações diferentes de um memo mito fundador, o do desafio do homem que vende a alma ao diabo, o seu percurso, os crimes e a transformação final, de redenção.
Papel que desempenha, nas várias “leituras” do mito, a dimensão simbólica do Eterno Feminino.

Comentar as “duas almas” de Fausto, que ele define como irreconciliáveis, na primeira parte da tragédia.

O que se perde e o  que fica destes e de outros mitos no nosso tempo…

II
Há muitas outras matérias que ocuparam o imaginário popular e literário ao longo do tempo:
Ex.
as lendas dos vampiros na Europa central: Nosferatu, primeiro filme de Murnau (pioneiro do cinema ainda mudo, expressionista;em seguida faria o Fausto);
Drácula, filme também da mesma época, com o célebre Bela Lugosi, no início dos anos trinta;
o Golem, inspirado num romance célebre de Gustav Meyrinck, autor austríaco estudioso de todas  as doutrinas e práticas ocultistas divulgadas ao tempo : como a Kabala judaica, que inspira o Golem, a filosofia taoísta, o yoga, a alquimia, etc, - em cada um dos seus romances uma doutrina que ele explica, embora reservando o seu mistério.

O gosto pela sombra (pelo mistério que perturba e atrai) não se perde, e vemos na literatura e na cinematografia moderna mais recente a recuperação dos temas dos vampiros, dos lobisomens (de que em Portugal também há variantes nos contos populares de tradição oral) e até a recuperação do gosto pela magia e por figuras da antiga tradição celta – como na saga de Harry Potter, já explorada até à exaustão para um público juvenil. 

Thursday, January 24, 2013

De Jean Cocteau (1889-1963) descubro agora em dvd um filme feito por ele e com ele, Le Testament d'Orphée, de 1960.
Imaginário mítico e simbólico elevado ao mais alto grau, em cenário surrealista, de que um Buñuel não desdenharia, e por onde passam grandes nomes do teatro e cinema: Maria Casarès, Daniel Gélin, Jean Marais, Yul Brynner, outros.
Do ambiente intemporal onde se atravessam limiares de morte e vida, luz e sombra, à vida de café boémio ( como no Café de Flore, à época) ou ao acampamento de ciganos, com flamengo, às piadas íntimas: chamar Éluard ao seu jovem guia, seu alter ego, num dos diálogos
-quel est son nom?
-Éluard
-un sobriquet? (alcunha)
-plutôt un pseudonime...
ou ao aparecimento fugaz de Picasso entre o grupo de pessoas que dum balcão espreitam Cocteau morto, e até a um dos vestidos que reconheci (sou desse tempo..) como um dos que se usou, da Boutique Elle, da revista do mesmo nome, nos Champs Élysées e que B.B. tornou célebre!
Mistérios do passado mítico atravessados pelo alegre incoformismo do imaginário poético de um surrealista que se definiu eterno, como a poesia!
A bela cena dos espelhos, que por um lado reflectem demais (ils réfléchissent trop...), por outro desvendam o lado de lá, o que se esconde de nós e somos nós na sombra, merece reflexão, atravessamento, como a  história de Alice do outro lado do espelho...
É do lado de lá  que a verdadeira vida acontece, a que devolve o outro a si mesmo, por via da criação, para sempre.