Tuesday, June 22, 2010

O Mito da Terra Perdida

Da autoria de Davide Bigalli, sugestão para estudiosos que gostem de continuar a ler em férias, obras de temas sedutores, como este, da Terra Perdida, da Atlântida de Platão a Thule, que reencontramos na balada do rei de Thule de um poeta como Goethe.
A nostalgia da Terra Perdida, que se transforma em Terra Prometida pelo milagre da nossa imaginação é agora satisfeita com esta obra, cuja leitura recomendo.
O logo da edição fala por si: Secretum, com o S no centro da serpente ouroboros.
Feito o périplo, da Atlântida ao Paraíso, como diz o autor, recomendo em especial o último capítulo da Parte III :
a terra oca ( la terra cava) e os mitos do século XX.
Era escondido numa caverna da montanha que o adepto alquimista de outrora, como na Atalanta Fugiens de Michael Maier e outros, poderia redescobrir o universo ao redescobrir-se a si mesmo.
Mas os mitos da Terra Oca são algo de diferente:
pressupõem um espaço oculto, de redenção e perfeição, no centro mesmo da terra onde uma nova humanidade-fundadora daria origem a uma nova terra, a esperada, a Prometida.
Humanidade e Perfeição Ilusórias que, no caso de um Horbiger, que o autor cita, e Hitler e seus seguidores, levaram o mundo aos pior dos horrores: a crueldade e o caos da Segunda Guerra Mundial, cujos efeitos ainda se fazem sentir.
Os mitos têm isso de complexo, na sua essência:
a sombra nunca anda muito distante da sua luz, o horror ( o culto e o serviço absoluto da Ideia Pura) integra o êxtase da Revelação ansiada.

Sunday, June 13, 2010

Círculos e mais círculos, para a Luciane G.




Para qualquer dúvida que tenhamos sobre algum símbolo, o seu significado, que pode ser múltiplo, é sempre útil consultar um bom dicionário de símbolos.
Há muitos, um dos meus preferidos é o de Jean Chevalier, nas edições Laffont.Mas há outros e o importante é que o grupo de colaboradores seja constituído por eruditos de reconhecido mérito.
Infelizmente basta alguma matéria se tornar moda para que apareçam logo imensos "sábios" disponíveis e de cultura vaga e confusa. Esses prejudicam quem queira mesmo estudar.
Vem isto a propósito de uma pergunta sobre o ouroboros, a serpente que se enrola devorando a própria cauda, e o alargamento dessa imagem à dos círculos.
A imagem que se tornou conhecida provém dos textos dos antigos alquimista, dos séculos II-III da nossa era. Havia, nessa altura, alguma identificação com o imaginário dos gnósticos, por sua vez contaminado pelas marcas orientais da grande roda do tempo, estudada por exemplo por Marie-Louise von Franz: Le Temps, le Fleuve et la Roue ( O Tempo, o Rio e a Roda).
Vejamos um pouco do que a autora nos diz:
No interior do círculo vemos todas as manifestações da criação, na sua múltipla e colorida variedade. E bem ao centro a serpente.
Estamos perante o Tempo, nos vários tempos: o cíclico, o histórico, linear, os seus ritmos e periodicidade ( nas Estações, por exemplo), as suas medidas, da mais pequena à maior que se possa conceber ( os éons de que falavam os gnósticos, mas hoje os astrofísicos falarão de outro modo).
Inicialmente o tempo era a representação da vida e do seu mistério: de como se nascia e se morria. Os antigos gregos identificavam o tempo a Oceanos, o rio divino que rodeava a terra bem como o universo inteiro sob a forma de rio circular ou de uma serpente que mordia a cauda e trazia nas costas o Zodíaco. Também o encontramos com a designação de Cronos.
Nos cultos Órficos este deus é Aion, a energia vital que tudo permeia, o que os psicólogos hoje definiriam como "princípio de energia psico-física". Aion é o "Senhor deus dos Éons".
Noutros cultos esta divindade, ou este princípio e origem da vida conhecida é identificado ao Sol. Temos em Râ o equivalente egípcio, o senhor do tempo que abria as portas da vida e da morte, e assumia todas as formas como senhor das metamorfoses: nascia escaravelho, anoitecia crocodilo, e depois da meia noite era o leão duplo do passado e do futuro "de ontem e de amanhã", como se dizia nos hinos.
Este mesmo simbolismo arquetipal do tempo como divindade e fluxo ininterrupto de vida e morte se encontra na religião hindu.
Na tradição cristã Deus, antes de criar o universo, concebeu um modelo mental em que todos os arquétipos, ou germens das coisas do porvir existiam em simultâneo.
"era um unus mundus, intemporal". Com o mundo real foi criado o tempo, os seus ciclos, o seu fim, numa concepção em que só o tempo transcendente se concebe como eterno.
Jung fará dos círculos, as formas mandálicas de meditação, um estudo profundo, no seu célebre Livro Vermelho, recentemente editado. Ao desenhar e pintar esses Mandalas prosseguia no seu próprio caminho de perfeição e completude; o círculo é uma imagem da completude divina, primordial, mas também humana, quando pela meditação a nossa consciência se altera, se aprofunda e se transforma.
Nos tratados de alquimia surgem por vezes círculos, como sóis, flutuando sobre as águas de um rio.
Aqui a figuração quer dizer simplesmente que se procedeu na Obra alquímica à sublimação da matéria. É o caso da Atalanta Fugiens, por exemplo, em que numa gravura os círculos são 4 bolas de fogo, sendo o fogo o elemento da sublimação por excelência (entre os quatro conhecidos, água, terra, fogo e ar).