AS MÃES
(lendo Goethe)
as cuidadoras.
é dado o barro
com que moldam as formas
as criaturas
cada qual com a sua vida...
Vidas longas
vidas breves
as mães cuidadoras
são cegas
não dizem às criaturas
o tempo dado
de espera
AS MÃES
(lendo Goethe)
as cuidadoras.
é dado o barro
com que moldam as formas
as criaturas
cada qual com a sua vida...
Vidas longas
vidas breves
as mães cuidadoras
são cegas
não dizem às criaturas
o tempo dado
de espera
O Pintor (ao modo de Jacques
Prévert)
Deu uns passos atrás
para assim ver melhor.
Pousou o pincel
ou seria espátula
ou raspadeira
ou tinta explodida
de tiro de caçadeira?
Olhava
Mas não sabia.
Teria dito
o que queria dizer?
E se ainda não tivesse dito
agora que tinha acabado
o que podia fazer?
Olhou mais uma vez
mais uns passos atrás:
dissera
“para mim a pintura é
resolver problemas” .
Estaria ali o problema
primeiro resolvido?
Ou dessa primeira solução
nascera
outro problema,
pedindo uma nova solução?
Uma solução-outra
de um nada nunca dito?
Afinal, concluiu ele cansado,
(pintara a noite toda
até de madrugada)
sentado no sofá e de copo na
mão
não é melhor um livro
que posso pôr de lado?
Mignon no Jardim do Limoeiro
Será sonho ou realidade
ver Mignon naquele Jardim
o limoeiro florindo
ela tecendo flores
coroando o seu Amado?
-Vem comigo, vem comigo
a terra é de maravilha, feita
de luz
tão brilhante
que mesmo o que é escuro
brilha...
O Amado foi com ela, ela já
ia pronta
ia mostrar o palácio de que
lhe tinha falado:
estátuas de belo mármore
finamente trabalhado
tectos altos, céus pintados,
e estranhos dragões ocultos
por outros anjos criados...
Eram seres de magia,
sussurravam ao ouvido
aqui vivereis para sempre,
na sombra do limoeiro
ou juntos ou separados.
Lisboa, 7 de Outubro, 2020
( para a Ana Maria Pereirinha, Na Galeria Monumental)
O Pintor e a tela branca
(para o Pedro Chorão, no
atelier desmanchado...)
naquela manhã de sol
em que acordou sem sonhar?
Pequenos rasgões de luz,
pequenos rasgões de negro
e matérias variadas
ali a desafiar.
e pinta
pega na tesoura e corta,
ou na faca da cozinha,
que lhe faltava afiar...
ali escondia de tudo,
farrapos
meio cozidos
nuvens por descarregar
e um certo azul magoado
que se deixava ficar...
em que a tela não falasse
nada lhe chegaria
nem que essa luta o matasse.
(Lisboa, 6 de Outubro, 2020)