Monday, July 07, 2014

Um leitor perguntou se eu conhecia uma tradução completa em português da Aurora Consurgens de São Tomás de Aquino.
Não conheço, embora fosse tão interessante tornar acessível a um público mais alargado este belíssimo tratado de transformação espiritual.
É um apócrifo, segundo os eruditos, embora Carl Gustav Jung e Marie-Louise von Franz, que o estudou e traduziu para alemão não recusem a ideia de que possa ter sido, em leito de morte, uma visão de Tomás que ele descreve ao secretário que teria ao seu lado. 
Percebemos, ao ler, que há ali muita inspiração do Cântico dos Cânticos, e do amor, do êxtase que flui no discurso dos amantes.
Mas há algo mais, e aqui entra um entendimento superior da alquimia e da sua Pedra como pedra de perfeição, sendo que essa pedra é figurada como eterno Feminino, a "pedra ao rubro" que nalgumas iluminuras de tratados antigos vemos de facto como "mulher vermelha".
Um vermelho que não é diabólico, mas divinal.
Mas voltando à pergunta do leitor, lembrei-me de que tinha nos meus livros uma tradução castelhana - afinal quem lê português pode ler castelhano sem dificuldade - do Tratado de la Piedra Filosofal Y Tratado sobre el Arte de la Alquimia, de SANTO TOMÁS DE AQUINO, com uma bela introdução de Gustav Meyrink, autor ele mesmo adepto da filosofia oculta em muitas vertentes que expõe na sua obra romanesca (editorial SIRIO, 1987).
Meyrink foi um dos primeiros que li, quando na Alemanha pesquisava outrora materiais herméticos, ( já pouco reeditado numa Alemanha, que detestava à época Jung e todo o pensamento menos ortodoxo, só estando traduzido para francês). 
O segundo Tratado é dedicado "ao irmão Reinaldo" de quem se conta que tomou nota da Aurora Consurgens.

É Grillot de Givry quem em primeiro lugar traduz do latim e faz uma bela edição na ARCHÈ,1979, com prefácio e notas inéditas.
Abrindo o livrinho temo uma reprodução de um quadro que se encontra na Igreja de Notre Dame de Paris, de autoria de Antoine Nicolas Langres (c. 1648) e representando São Tomás na Fonte da Sabedoria.
Claro que o autor/ tradutor aponta que os tratados são ditos como atribuições, pois seria difícil, séculos atrás, tendo até alguns alquimistas sido perseguidos pela Igreja, aceitar sem mais que um santo e filósofo desta envergadura pudesse ter tido interesse em alguma vez estudar e ainda menos escrever sobre matérias "obscuras".Mas aí estão, a Aurora... que terá inspirado Jacob Boehme, o célebre teósofo alemão e estes tratados, cuja indicação deixo, em francês e castelhano, para quem deseje ler.
Acrescento, por ter sido tão importante na minha formação intelectual a obra de Etienne Perrot,
L'AURORE OCCIDENTALE (ed. La Fontaine de Pierre, 1982) que abre com a tradução integral do texto de Tomás de Aquino, seguido da série de seminários que deu em Paris, nos anos 60 e 70, e a que tive a honra de poder assistir (não a todos, mas à maior parte).
Alquimista Junguiano, com ele se pode aprender, nesta como noutras obras, o sentido "amplificado" das matérias alquímicas e simbólicas, bem como o sentido arquetípico dos sonhos recorrentes.
Boa sugestão seria traduzir para a nossa língua os seus títulos mais destacados.


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