Monday, September 17, 2007

Libro del Tesoro


Libro del Tesoro. fecho por mi D. Alonso que soy de España.

Esta é uma cópia desconhecida, até à data, que se encontra na Biblioteca da Ajuda, incluída numa miscelânea manuscrita juntamente com outros textos alquímicos.
Para melhor compreensão devemos ler, como disse num post anterior, os estudos de Luanco e de Juan Garcia Font.
Das notas ao Libro del Tesoro ó del Candado, o primeiro texto que ele aborda no volume de 1889, escreve que são conhecidos dois códices, indevidamente atribuídos ao Rei D.Afonso o Sábio: um está guardado na Biblioteca Nacional e foi descrito por D.Tomás António Sánchez; e o outro está na Academia Sevilhana de Buenas Letras, divulgado por D.José Amador de los Ríos.
Luanco faz uma transcrição anotada de ambos, colocando-os lado a lado na página para que se vejam as diferentes variantes .
Já no volume de 1897 um terceiro tratado é acrescentado a estes, e igualmente transcrito: o do códice de Palomares, sendo que neste encontro as semelhanças que farão do nosso ou uma cópia sua ou uma primeira versão, algo que merece ser estudado.
A D. Francisco Javier de Santiago Palomares pertencem os três tomos en folio, manuscritos "com a formosa letra espanhola do calígrafo Palomares..."em que se encontra outra versão do Livro do Tesouro, juntamente com uma preciosa quantidade de outros tratados alquímicos de autores de renome. Luanco considera esta a mais copiosa colecção alquímica jamais encontrada entre as espanholas que conheceu.
Luanco observa ainda que os volumes não foram numerados e é possível que não sejam os únicos saídos da mão do copista:"No están señalados los tres volúmenes con los números ordinales y acaso no séan los únicos que salieron de la mano del pacientísimo copista".
O mais interessante é ainda verificar o interesse que o copista demonstrou pela matéria alquímica ao copiar e traduzir, do latim e do francês para castelhano, os outros textos constantes destes volumes.
Tendo sido o autor de uma Arte Nueva de Escribir, foi-lhe fácil, nalguns casos, pôr em verso a matéria traduzida.

Deste modo veremos Luanco transcrever, para melhor comparação de variantes, o códice de Palomares, que ele considera o mais completo, contendo descriçoes e estrofes que faltam nos de Madrid e de Sevilha. Ao todo contam-se 77 oitavas, número muito da preferencia do Rei Afonso X (mas não esqueçamos que se trata de uma atribuição, ou como tal considerada até à data pelos especialistas).
Segundo Amador de los Rios o autor deste livro do Tesouro foi o famoso D.Enrique de Aragão, Marquês de Vilhena.

Quanto ao noso códice, é proveniente da Biblioteca do 2.Conde de Redondo, D. Tomé de Sousa (o que se vê pelo sinal da guarda).Esta biblioteca foi vendida pela sua viúva, depois do terrmoto, ao Rei D. José e integrada na Biblioteca Real.

Logo de início, e como era habitual entre os adeptos, para se resguardarem de possíveis acusações, o autor agradece a Deus as grandes misericórdias que lhe concedeu, a sua santa fé e e o alto bem do conhecimento da "pedra dos filósofos". Citando Salomão, recorda que não há Sabedoria sem bondade- daí que, mercê da Pedra, se tenha dedicado a muitas obras de caridade. Para que os segredos do Livro não caissem em mãos indevidas escreveu o autor em versos :
" Porque yo dixe ca syendo comun llegaria a manos de homes no buenos; y porque sepades en como fuy sabido deste alto saber, yo vos lo diré en eroicas, ca sabed que el verso face excelentes y mas bien oydos los casos".
Ainda nesta apresentação comenta que com este grande Tesouro aumentou os seus bens, guiado pelo seu Mestre. A referencia aos bens materiais proporcionados pela Pedra Filosofal aumentaria certamente a curiosidade de todos os que viessem a ler este Tratado. Mas o bom tom mandaria que o "trabalho" fosse iniciado em nome de Deus:
" En el Nome de Dios face principio la obra".
Das terras de Egipto chegou a notícia de um sábio astrólogo e bom profeta de feitos vindouros.O rei envia-lhe um mensageiro, convidando-o para a sua corte:
" aberes,faziendas, y muchos dineros
allí le offreci con sana intencion".

Vem então de Alexandria o sábio generoso, que avisou não querer ouro, nem prata mas apenas servir com boas graças o rei que o procurava. E diz o rei:
"La piedra que llaman philosophal
sabia facer, y me la enseño
ficemosla juntos; después solo yo
con que muchas veces crecio mi caudal
e viendo que puede facerse otro tal
de muitas maneiras mas siempre una cosa
yo vos propongo la menos penosa
por más excellente, y mas principal".

De notar que há muitas maneiras de fazer a Obra, tal como haverá muitas cores a marcar os sucessos, e muitos nomes a designar a Pedra.
Em seguida refere-se que os ensinamento não provieram de caldeus, nem de fenícios, nem de árabes, egípcios, sírios, indianos, sarracenos- nenhuma das gentes do Oriente. Talvez para afastar fantasmas de magia, que sempre acompanharam o imaginário relativo à Arte alquímica. Explica então:
"Ficieran mi obra, yberos tan buenos
Que honran las partes de nuestro occidente".

O segredo será transmitido em verso e em cifra, sendo esta a maior dificuldade que o adepto terá de vencer. Até hoje ninguém entendeu a cifra com que se fecha a primeira parte do tratado.
De estrofe em estrofe vai o autor resumindo a essencia da sua Arte.
Os vários nomes da Materia Prima da Pedra, com as várias qualidades que lhe são conhecidas, sempre desenhadas em pares de opostos: húmido e seco, representando as duas vias possíveis, que formam o um e o todo: "ca en un singular/contiene dos cosas de una vegada".
Assim encontramos o quente e o frio, o homem e a mulher, a água e a terra, - e de todos estes contrários a imagem de um "matrimónio" que já Hermes definira como sendo de Céu e Terra.
Chega-se à Quinta-Essência que é "essencia de todo /porque esta materia es en tal modo/ ca todas las cosas viene à componer".
Materia prima, "antigo caos", quinta-essencia : a Pedra resulta da sublimação desta primeira massa confusa da qual tudo,vegetal, mineral, animal, no universo criado, se origina.Este é o primeiro dos olhares dos sábios sobre o mistério da criação do universo.

A descrição dos utensílios é a que normalmente se encontra desenhada, ou apenas referida:
um vaso esférico de vidro ( que muitos denominam de útero,de ventre ou de matriz ), um tacho de barro onde o vaso é metido, um forno de barro, um fogo lento, de lenha, para a cosedura secreta.
No vaso de vidro foi colocado mercúrio: é ele, o produto lunar ( a matéria húmida da obra ) que terá de ser unido ao enxofre solar e seco em posteriores operações.
A esta primeira parte de trabalho da materia chama o autor "tierra/ sulfur,muger, calido y seco...Penélope,...viuda palida y flaca". Por uma razão, terá de dar-se logo a conjunção com os outros elementos ( opostos ) que a completem, em partes iguais.
Teremos então a marca da nigredo, o negro, indicativo da "corrupção" da materia primeira, a larva que se transformará em borboleta alada ( as várias cores, e a representação da Pedra sublimada, pois ganhou asas que a elevam da terra ou da água, conforme o caso ):

Veredes la obra en la su negrura
Trocando aquel ser de como nació
ca no será ya la cosa que obró
en su principio la Madre Natura.
....
Non vistes la carcel que fiço de seda
para si el gusano adonde murió
e alli su cadaver por muerto fincó
en fuesa que fiço adonde se enreda
ca la corrupcion en este non veda
de le resurgir en forma distinta
de la su primera, pues naçe y se quiere
vivo, e con alas en forma mas leda".

Na vida da Obra nasce um espírito novo a partir de uma nova substância, marcada pela côr negra.
Surgirão em seguida muitas outras cores, designadas pelo termo de cauda pavonis e que o autor descreve deste modo:

" Despues de pasada aquesta color
vereis otras muchas en sus diferencias
ca son semejantes en sus aparencias
al Argos, y al Iris en su resplendor
Ca la sequedad del liquido humor
face ser esto de varia pitura
fasta llegar à cierta blancura
adonde aumentad un poco el calor".

Da nigredo e da cauda pavonis à albedo, o branco da sublimação desejada, indicando a perfeição da Pedra:

" Ca à la fizacion entonces se obra
e no puede ser jamas desunida
aunque mil años fuese escondida
porque la Union entonces se cobra".

A transmutação continua, indicada pelas cores amarelo-citrino (citrinitas) e vermelho, ou neste caso "roxo muy puro (rubedo), terminando a Pedra por fixar-se no corpo de um rubi.
Outras indicações foram deixadas, mas significam o mesmo processo de transmutação da albedo à rubedo: elixir de prata, para o branco, pedra citrina para o ouro que se deseja obter no fim.

Se desejar a continuação da sua Obra, deve então o adepto prosseguir calcinando a Pedra, agora colocada em vasilha de barro tapada por outra igual ed eixada a cozer em fogão de lenha.
Como se tudo voltasse ao princípio, da Pedra se regressa ao pó (da calcinação), às cinzas, cujo poder terá sido aumentado de tal forma que a materia se torna divina, quinta essencia "que a todo se aplica,e todo es potencia/ e ser de la cosa a do se encamina".
Mágica qualidade a deste princípio da Natureza transfigurada pela mão do alquimista:

" En este principio de Naturaleza
no es oro, ni plata, ni otro metal
ni forma sujeta a algun vegetal
mas disposición que a todo endereza.
Si al oro se aplica,del toma firmeza
para convertir en oro las cosas.
Si al home lo mismo por obras famosas
le da sanidad con suma entereza".

Mudou-se então a matéria em Elixir de longa vida, a outra variante tão procurada, tão ambicionada quanto a riqueza acrescentada do ouro pelo toque do ouro.
Ao caminhar para o fim da lição, deixa o autor a indicação da Pedra, como tal, do Elixir, se essa fôr a escolha, e mais um último segredo: o da projecção, a saber do aumento proporcional da quantidade de Elixir, ou de Pedra calcinada que se deseje obter.
Basta um grão para garantir saúde, sorte, fortuna...

"A todo se aplica, e todo convierte
en un natural bien complesionado
un grano partido deaquesto es tomado
por boca le face al home ser fuerte
al flaco, e debil le pone de suerte
que tanta salud no tuvo ninguno.
Si el tiempo que à todos es importuno
a este le lleva sano à la muerte.

Finis laus deo "

Repare-se na fina ironia do último verso, recordando que a morte a todos levará, quando chegar a hora, estejam doentes ou muito bem de saúde...Findo o exercício alquímico o que o autor nos lega é o mistério de sempre: o da utopia de que ao homem é permitido "mudar" a natureza, interferindo ( ainda que para o melhorar, o "redimir", como diziam alguns) no projecto da criação divina.

Seguem-se no manuscrito um conjunto de considerações ilegíveis, incluindo o tal discurso cifrado, e apresenta-se de seguida a 2a. Parte del Rey D.Alonso.

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