L'ÉTERNITÉ
( ao Pedro e à Cristina )
A entrada, neste ano de 2012, no ano chinês do Dragão de Água trouxe-me de imediato à memória a imagem do Fogo e da Água e do simbolismo da sua Conjunção.
( ao Pedro e à Cristina )
A entrada, neste ano de 2012, no ano chinês do Dragão de Água trouxe-me de imediato à memória a imagem do Fogo e da Água e do simbolismo da sua Conjunção.
Uma oposição / fusão de contrários forçando ao mesmo tempo uma libertação de energias profundas, e uma Iluminação como as que o poeta Arthur Rimbaud (1854-1891) nos descreveu em alguns dos seus belíssimos, fortíssimos textos.
Rimbaud e a simbólica alquímica dos seus poemas...
Penso em Marine, (Illuminations) de que já me ocupei nalgum lugar.
Mas penso também agora em L'Éternité (Vers Nouveaux et Chansons) onde encontro uma emoção, uma pulsão semelhante:
L'ÉTERNITÉ
Elle est retrouvée.
Quoi? -L'Éternité.
C'est la mer allée
Avec le soleil.
Âme sentinelle,
Murmurons l'aveu
De la nuit si nulle
Et du jour en feu.
Des humains suffrages,
Des communs élans
Là tu te dégages
Et voles selon.
Puisque de vous seules,
Braises de satin,
Le Devoir s'exhale
Sans qu'on dise: enfin.
Là pas d'espérance,
Nul orietur.
Science avec patience,
Le supplice est sur.
Elle est retrouvée.
Quoi? - L'Éternité.
C'est la mer allée
Avec le soleil.
(Maio 1872)
Como é frequente nas revelações místicas e sobretudo nas alquímicas ocidentais ou orientais mais conhecidas, é logo nas primeiras imagens que é dada a revelação: neste caso a imagem da Eternidade com o seu sentido mais profundo e oculto do mar fugido com o sol. Por outras palavras uma conjunção dos elementos opostos água e fogo, sendo aqui figurados pelo mar e pelo sol. Nessa união mística ( mysterium coniunctionis da definição de Jung) se condensa e revela o segredo da Eternidade.
Nas notas e comentários que acompanham a edição das obras completas da Pléiade Antoine Adam observa, e bem, que não se trata neste poema, como muitos autores desejaram, de uma explosão semi-pagã, de culto do corpo e da natureza, um pouco ao modo de Walt Whitman nas suas Leaves of Grass. Trata-se antes de um abandono consciente da fatuidade da fama e suas premências, de um apelo "à ciência e à paciência" (p. 935).
Eu acrescento os termos que A. Adam não chegou a usar e leio que no poema, e sua exaltação de contrários, se trata, pelo contrário, de uma experiência de abandono ao que os alquimistas chamaram de nigredo, a depressão de alma, a descida ou abandono a um silêncio interior que permite ao poeta escapar aos ditames do Tempo e alcançar desse modo a vivência de alguma Eternidade: esta, a sua, e que para nós permanece como júbilo e mistério até hoje, quando o lemos.
Na segunda estrofe se alude a outro par de opostos: a noite (nula) e o dia (em fogo). A noite é nula porque anula, na sua escuridão, as frágeis emoções do dia. E por isso na estrofe seguinte se pode dizer como evolui esse caminho de busca e anulação: na libertação dos impulsos mais comuns (mais vulgares) que permitirá o vôo de alma mais ansiado. As estrofes 4 e 5 descrevem então a nigredo de alma que é preciso "sofrer" para atingir com ciência e paciência um patamar mais alto, como em toda a iniciação. O sofrimento é grande, porque resulta de uma abdicação da vontade e do desejo mais imediato que pode ser dolorosa. Já em Fernando Pessoa iremos encontrar uma abdicação de melancolia igualmente assumida e dolorosa: o eu material, pequeno, anula-se para dar lugar a um Eu espiritualizado, bem maior.
A imagem do suplício consta em tantas e tantas gravuras e descrições alquímicas que é difícil que os comentadores não tenham desde logo percebido o alcance destes versos, neste contexto de revelação que "abre e fecha" o Todo do poema.
A ETERNIDADE
Foi reencontrada.
O Quê ? - A Eternidade.
É o mar fugido
Com o sol.
Alma vigilante,
Digamos o segredo
Duma noite nula
E dum dia aceso.
Sufrágios humanos,
Vulgares impulsos
Deles te libertas
E pairas voando.
Pois que só de vós,
Carvões de cetim,
O Dever se exala
Sem que tenha fim.
Lá não há esperança,
Nenhum orietur.
Ciência com paciência,
Seguro o sofrimento.
Foi reencontrada.
O Quê ? - A Eternidade.
É o mar fugido
com o sol.
Nota Final:
Dir-se-á que a imagem dos opostos
la mer / le soleil - feminino / masculino
se atenua no caso da versão portuguesa: o mar / o sol, ambos masculinos. Mas não se atenua a pulsão sensual, dada pelo movimento do verbo, em ambas as línguas: aller avec, ir com, é na linguagem dos amantes fugir um com o outro; e o sentido mantém-se na formulação que escolhi, " o mar fugido / com o sol".
Os leitores dirão!
A ETERNIDADE
Foi reencontrada.
O Quê ? - A Eternidade.
É o mar fugido
Com o sol.
Alma vigilante,
Digamos o segredo
Duma noite nula
E dum dia aceso.
Sufrágios humanos,
Vulgares impulsos
Deles te libertas
E pairas voando.
Pois que só de vós,
Carvões de cetim,
O Dever se exala
Sem que tenha fim.
Lá não há esperança,
Nenhum orietur.
Ciência com paciência,
Seguro o sofrimento.
Foi reencontrada.
O Quê ? - A Eternidade.
É o mar fugido
com o sol.
Nota Final:
Dir-se-á que a imagem dos opostos
la mer / le soleil - feminino / masculino
se atenua no caso da versão portuguesa: o mar / o sol, ambos masculinos. Mas não se atenua a pulsão sensual, dada pelo movimento do verbo, em ambas as línguas: aller avec, ir com, é na linguagem dos amantes fugir um com o outro; e o sentido mantém-se na formulação que escolhi, " o mar fugido / com o sol".
Os leitores dirão!