Wednesday, August 23, 2006

Pessoa /Alvaro de Campos

The well of nigredo:
" The ancients used to invoke the Muses.
We invoke ourselves.
I don't know if the Muses appeared-
Invoked and invocation must have had some
conformity-
But I know we don't appear.
How often I have leaned
Over the well I suppose I am
And bleated 'Ah!' to hear an echo,
And have not heard more than what I saw-
The vague dim dawn-grey of the water answering
the light
Down there in the uselessness at the bottom...
No echo for me...
Only, vaguely, a face,
Which must be mine since it can't be someone else's.
It is a thing almost invisible,
Except as and when luminously I see
There at the bottom...
In the silence and the false light at the bottom...

What a Muse !..."

(Translated by Jonathan Griffin )

The essence of Pessoa was religion and scepticism, writes J.Griffin in the Introduction to this translation.And he goes on : "Pessoa was not a naif, anything but . He was looking for a meaning, not ruling out any possibility and not liking what he thought he found. He believed as a man believes who wishes he did not:
' Why did you give what I asked, Holiness?
I know the Truth , at last, of the real Being.
Would it had pleased God I should know less! '.

Pessoa , through all his heteronyms, lived and wrote constantly in this akward oscillation between believing and denying.
I conclude with Griffin: "So, in poem after poem, the end-effect is a lucid mystery : in a closed form, an open content."

(See the Introduction to Fernando Pessoa, Selected Poems, Penguin )

Tuesday, August 22, 2006

Da Nigredo I


1
Nigredo, a depressão mais negra, o abismo pasmado em que se cai.Treva que paralisa, olhar que não se fixa, melancolia, asa de corvo, descida ao vale...morte, de que se tem consciencia.
São tantas as formas .
Albrecht Duerer, um alquimista da alma.
2
Basilio Valentino, monge beneditino do século XV a quem estão atribuídos muitos tratados de alquimia expõe nas DOZE CHAVES DA FILOSOFIA uma doutrina que revela estreito conhecimento da ciência hermética.Reza a lenda que os seus escritos foram encontrados em Erfurt devido a um relâmpago que fez abrir uma coluna, deixando-os a descoberto. A versão latina da Doze Chaves foi divulgada por Michael Maier, médico da corte de Rudolfo II, e em regra é sobre esta versão que os estudiosos trabalham.
O paradigma da Grande Obra define-se por esta legenda:" Visita o interior da Terra e Rectificando descobres a Pedra Oculta". É no termo rectificando que reside todo o segredo; pois não bastará descer ao interior da terra, reconhecer o abismo em que a marca do Negro, da Nigredo, nos faz cair - será preciso , por uma especial purificação, consciencialização (sublimação) atingir um supremo entendimento (integração ) da condição que é a nossa. A Pedra somos nós,a menos que se leia a alquimia como processo real de manipulação química com que se pretenda fazer ouro.Também é possível, mas não é disso que falaremos aqui.
3
O esqueleto que se anuncia como cavaleiro da morte, em Duerer, tal como o esqueleto que se ergue do caixão, em Valentino,
prefigura de facto a morte que a todos espera, mas tem além disso outro valor simbólico : o anúncio de que a morte é o princípio de uma Ressureição, algo que para todo o espírito religioso fazia sentido, e para o espírito do alquimista ainda mais, pois a metamorfose desejada lhe seria ainda mais possível e mais próxima - como forma de arrebatamento místico e fusão com uma luz puramente interior.
É esse o significado do lírio e das flores que se notam na gravura, bem como da luz acesa na vela. O carvalho seco deixa ver atrás uma árvore que é já a Árvore da Vida.
4
Na filosofia química nada é despiciendo ou desprezível: não há caput mortuum, como dizem os alquimistas; tudo é passível de transformação, transmutação luminosa.
5
Citando Basilio Valentino:
"Um céu e uma terra novos serão formados..e um novo homem aparecerá mais brilhante do que antes, e será glorificado".

Da Nigredo II

Fernando Pessoa

Lâmpada deserta,
No átrio sossegado.
Há sombra desperta
Onde se ergue o estrado.

No estrado está posto
Um caixão floral.
No átrio está exposto
O corpo fatal.

Não dizem quem era
No sonho que teve.
E a sombra que o espera
É a vida em que esteve.

Da Nigredo III



Eis a Anima prostrada, apontando para o crâneo da Mortificação, outro dos nomes da Nigredo.
A Árvore cuja raiz sai da sua cabeça simboliza a necessidade de conjugar a Emoção com a Razão - para que se atinja nova plenitude, entendida, integrada.

Da Nigredo IV



Fernando Pessoa/Álvaro de Campos

"Desfraldando ao conjunto fictício dos céus estrelados
O esplendor do sentido nenhum da vida...

Toquem num arraial a marcha fúnebre minha!
Quero cessar sem consequencias...
Quero ir para a morte como para uma festa ao crepúsculo".


Espírito e alma separados, como na gravura, levam a marca negra do corvo.

Da Nigredo V


Fernando Pessoa vive entre sombra e luz, numa doença de alma interminável:

Exígua lâmpada tranquila,
Quem te alumia e me dá luz,
Entre quem és e eu sou oscila.

Este" Quem" oscila porque não é reconhecido. Entre ser luz e ser sombra - se desenha a hesitação ( o eterno Intervalo ) do poeta :

Esta espécie de loucura
Que é pouco chamar talento
E que brilha em mim, na escura
Confusão do pensamento,

Não me traz felicidade;
Porque, enfim, sempre haverá
Sol ou sombra na cidade.
Mas em mim não sei o que há.